O Campo Transcultural e a Enfermidade.

paciente feliz jovem asiatica descansando na cama do hospital e sorrir

Quando a enfermidade bate a porta

Não combinam. Afinal o campo transcultural é o lugar da obediência, o lugar onde a realização do chamado acontece, onde a nação da convicção vai moldando o viver diário da mulher multicultural, marcando a identidade individual e da família.
Não combinam, porque campo é sinal de trabalho, de realização de projetos, mobilização, transformação..
Não há tempo para enfermidades, afinal no desbravar constante e incansável das tarefas, da prestação de contas, da construção de uma carreira de trabalho multicultural, o espaço para a descoberta de um câncer por exemplo, não existe! Até que ele chega.
Celebramos o Outubro Rosa, com o destaque para a prevenção ao Câncer de Mama. Um marco importante, para nos fazer lembrar que o câncer é real e que é possível preveni-lo através do rastreio e autocuidado.
O que ocorre muitas vezes, para aqueles que estão a servir além fronteiras, é que o espaço entre trabalho e autocuidado muitas vezes não existe.
Lembro-me de estar internada no 4º andar de um hospital em Lisboa, logo após uma cirurgia ao pulmão (lobectomia pulmonar) onde me foi retirado gânglios e um tumor maligno, juntamente com parte do pulmão direito.

mulher usando uma mascara olhando pela janela durante um bloqueio 1


Ao olhar pela janela daquele 4º andar, vi o transito na ponte que liga a Margem Sul do Rio Tejo e a cidade de Lisboa. Paisagem linda que em outra ocasião teria me despertado à poesia. Naquele dia, entretanto observei a pressa de um tráfico intenso, pessoas a correr daqui para ali em busca de chegar a algum lugar: um alvo, um objetivo, uma função… De repente senti-me solitária e o grito contido dizia: “parem por favor, porque algo muito importante está a acontecer aqui”, até perceber que eu mesma estaria ali, na correria dos dias em busca de chegar a algum lugar, aos planos estabelecidos e aos alvos traçados…
Foi naquele dia que comecei a ouvir a doce voz do Espírito a ensinar-me um caminho sobre modo diferente.
Olhei ao redor e vi, médicos, enfermeiros, auxiliares… todos portugueses e que naquele contexto estavam a me abençoar, como um ciclo que se completava para mim, de ter vindo abençoar e agora estar a ser abençoada.
Vi Deus como Ele é, bom pastor, soberano, amoroso… cuidador mesmo no meio da dificuldade. Afinal Ele conhece a minha dor, os meus medos e mesmo quando as respostas não chegam, tal e qual esperamos, Ele continua perto, porque este é o Seu Caráter, Sua presença, Seu Conforto…
No decorrer de todos estes anos, vi colegas, lideres, pastores, obreiros multiculturais, enfrentarem o câncer, com a disposição que dizia: tenho pressa, não tenho tempo para pequenas coisas, é urgente…
Vi alguns deles partirem, outros superarem a doença e ainda assim a obra continuar…
Na minha experiência ao enfrentar o câncer e o tratamento com a quimioterapia, tenho aprendido que “a cada dia basta o seu mal”.
Tenho aprendido também a acessar o lugar da vulnerabilidade nos momentos de dor, inconstância dos sintomas, medo, esperança… tudo num misto de sim e não, que me ensina a cuidar e ser cuidada.


Não estou sozinha, vivo um dia de cada vez dentro da descoberta que as minhas emoções importam, o respeito ao meu corpo e as suas necessidades também e principalmente, tenho constatado que o chamado e a obra multicultural são importantes, mas elas não dependem de mim, porque a obra é feita por Deus e ELE “há de completá-la até os dias de Cristo Jesus”.
Não, o câncer não é uma sentença de morte, mas um caminho de descoberta de vida, passível de diagnósticos precoces, (como foi o meu caso) e passível de tratamentos saudáveis e preventivos que podem prevenir a doença.
Fica o alerta para o autocuidado, para o descanso necessário e para uma espiritualidade saudável, que dá lugar a dependência total Àquele que é o autor da vida.
Fica também o alerta para a certeza de que embora a obra seja fundamental, a correria dos dias precisa dar lugar a convicção de que somos apenas a tinta que Deus usa para escrever a história das nações, uma história com começo, meio e fim… até a eternidade.

Arlete Castro é obreira da Sepal – Coordena a área de Cuidado Integral dos Trabalhadores Transculturais
Psicóloga Clinica e do Aconselhamento – Coordena juntamente com o marido, Luiz Castro, o PitStop em Portugal, onde recebem famílias de pastores, trabalhadores globais para temporadas terapêuticas e aconselhamento.
Autora dos livros “Mulheres com História”, “Pérola” e “Simplesmente Sofia”, você pode adquirir AQUI

Confira mais textos e artigos relacionados à Mulher Multicultural no nosso Blog CMM, Clicando AQUI

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima