Desafios de ser obreira e esposa entre culturas

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“Você é obreira transcultural? Que trabalho você tá realizando aqui nesse país?” pergunta que escuto constantemente ao conhecer uma nova obreira.

Esta questão revela a tendência que muitos obreiros têm de dar atenção ao fazer, negligenciando o ser; ser esposa, ser mãe, ser mulher, ser filha de Deus e ministra do Evangelho. Porém, o chamado de Deus para sua Missão está muito mais relacionado à maneira como vivemos para sua glória do que as muitas atividades que desenvolvemos no campo transcultural. Neste escrito me proponho esclarecer dois aspectos no cumprimento da vocação que é digno de nossa atenção neste tempo.

Resposta ao desafio de ser esposa no campo transcultural

Quando respondemos positivamente o chamado para servir na obra transcultural, devemos levar em conta que ser esposa também faz parte da missão de Deus. A vida entre culturas é o reflexo daquilo que vivemos em casa. Quando exercemos o papel de esposa no campo transcultural de maneira como Deus idealizou, também estamos cumprindo sua Missão. No capitulo 2 de Tito, o apóstolo Paulo orienta às mulheres a viverem a vida no lar honrando o esposo e sendo exemplo para as mulheres mais jovens, de tal forma que sirva para a boa reputação do Evangelho.

Isso me leva a pensar que minha dedicação também ao que concerne ao lar, transbordará para outras esferas da minha vida e glorificará o nome do Senhor. Se não entendermos de que toda a nossa maneira de viver faz parte da labor que Deus nos confiou, passamos a nos dedicar a uma infinidade de atividades externas como sendo isso apenas obra de Deus.

Ou ainda, podemos nos sentir frustradas se não pudermos nos dedicar ao ministério fora do lar, seja porque as crianças precisam de mais atenção ou porque o esposo já está desenvolvendo algo lá fora. Margaretha Adwardana (1998, p. 181) citando as constatações de Donovan e Myors observa que: “alguns casos de retorno prematuro do campo ocorrem por causa da insatisfação das esposas com seu ministério. […] Muitas delas esperam assumir funções de acordo com sua qualificação”. Isso ocorre quando as mulheres não são conscientes de que sua dedicação ao lar também é um ministério.

Recordo-me de um ocorrido que marcou minha vida ainda quando eu era solteira, há 23 anos. Eu estava no CEM nessa época. Lembro-me de estar ansiosa esperando a chegada de um professor que todos os alunos sonhavam em conhecê-lo, missionário holandês que havia servido no Brasil mais de 40 anos. Então, como responsável dos cultos devocionais, assim que ele chegou, eu convidei sua esposa, que o acompanhava, para pregar em uma de nossas celebrações. Porém, para minha surpresa ela logo me respondeu: “sinto muito, mas esse não é o meu ministério”.

Foi chocante a resposta dela, gerou em mim um turbilhão de reflexão sobre a convicção dos diferentes ministérios na Missão de Deus. Não fiquei chocada negativamente, pelo contrário, ela já estava pregando com aquela resposta. Esta mulher tinha convicção do seu ministério, e não fazia questão de fazer aquilo que não se sentia chamada a fazer somente para agradar a outros. Ela me ensinou com sua vida naquela semana sem muitas palavras. Ver o cuidado dela com aquele professor idoso, os dois passeando de mãos dadas pelo jardim e ele recolhendo flores para sua esposa, foi o melhor sermão o qual não esquecerei jamais.

Da mesma forma que o ministério do lar precisa de atenção estando no campo transcultural, assim mesmo é o nosso relacionamento conjugal.

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Resposta ao desafio de manter o relacionamento conjugal saudável no campo transcultural

O relacionamento conjugal dos obreiro transculturais pode estar em xeque se não considerarmos o custo de viver em uma nova cultura. Estar fora de nossa zona de conforto implica aprender do zero a se comunicar, a fazer coisas básicas como se comportar em público, discernir o que é permitido ou não na nova cultura e muito mais. Requer-se muito mais energia e esforço para aprender a viver no novo campo transcultural. Essa pressão pode afetar todas as áreas da nossa vida, inclusive o nosso casamento.

Pequenos problemas conjugais existentes antes de sair da pátria podem se agravar na rotina desgastante da nova cultura. Ted Limpic (1998, p. 133) constatou em suas pesquisas que, questões relacionadas ao casamento são uma das causas principais do retorno prematuro dos obreiros brasileiros do campo. Isso nos serve de indicador para colocarmos atenção dobrada no relacionamento conjugal daqueles que estão servindo em contexto transcultural.

Quando nos casamos em 2000, passamos um ano no Brasil antes do nosso retorno a outro país. Incrível como em nossa pátria contamos com uma série de programas para a edificação do casamento. Neste período tivemos a oportunidade de participar de alguns encontros, cursos para casais e aconselhamento pastoral. Tudo isso serviu como ferramenta para desenvolver alguns hábitos que nos ajudaram no decorrer dos anos neste país que vivemos até hoje, já que aqui não contamos com todos estes recursos que nos brinda a igreja em nossa pátria.

Quero compartilhar com vocês, como sugestão, pequenos gestos que contribui para manter nosso relacionamento conjugal saudável, ainda estando longe da nossa zona de conforto. No entanto, estar consciente de que necessito investir no meu próprio crescimento pessoal e como esposa é o primeiro passo. Segue algumas sugestões:

  • Leve para o campo transcultural alguns livros sobre o tema de casamento e a identidade da mulher. Uma boa leitura sobre esse assunto nos trás renovação, tanto para nosso casamento como para fortalecer nossa identidade como mulher.
  • Tenham um dia fixo para fazer algo prazeroso como casal. Saiam para tomar um café a dois, ou apenas para uma caminhada. Não precisamos de dinheiro para fazer algo agradável, podem jogar um jogo de tabuleiro ou cartas, ver um filme juntos ou apenas sentar na varanda para conversar e lembrar as coisas agradáveis da vida e contemplar o amor de Deus. Encontramos tempo para tudo e para todos, então, mais que merecido ter o tempo exclusivo para o casal.
  • Cultivem a intimidade. Orem juntos e conversem sobre o relacionamento conjugal. Ainda que tenham muitos anos de casados, avaliação é sempre necessária. Falem sobre que hábitos podem melhorar e de que forma podem demonstrar mais amor um para com o outro. Escolham um momento que os dois estejam descontraídos para falar sobre temas mais delicados. Discutir sobre as diferenças quando estão cansados só agrava o problema.
  • Participem de eventos e palestras online. Agora com as plataformas de comunicação online podemos nutrir nosso relacionamento mesmo estando longe da igreja local. Os encontros mensais do CMM é uma ferramenta preciosa para nosso crescimento como esposa, mãe e obreira transcultural.

Concluímos que a resposta para o desafio de ser esposa transcultural e a resposta ao desafio de manter um relacionamento saudável no campo transcultural, se deve a uma compreensão correta de que ambos fazem parte do cumprimento da Missão de Deus na terra. Proponho que considere seu papel de esposa como um ministério reconhecido e validado por Deus. Que ponha a devida atenção ao seu relacionamento conjugal como algo que glorifica ao Senhor e comunica a mensagem do Evangelho.

Bibliografia

LIMPIC, TED. Os missionários brasileiros: Quanto tempo eles estão ficando. In: TAYLOR, W. D. (Ed.). Valioso demais para que se perca. Um estudo das causas e curas do retorno prematuro de missionários. Curitiba: Descoberta Editora, 1998. p. 125-140.

ADWARDANA, MARGARETHA. Treinamento formal e não formal anterior ao campo. In: TAYLOR, W. D. (Ed.). Valioso demais para que se perca. Um estudo das causas e curas do retorno prematuro de missionários. Curitiba: Descoberta Editora, 1998. p. 175-186.

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Daniela Condor

Colaboradora da redação do Blog CMM, esposa, mãe, servindo entre culturas desde 1995. Atualmente vivendo em um país da África Ocidental.

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